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sábado, 29 de julho de 2023

Adendo do Blog - Considerações sobre a ADPF 442

 ADPF - Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental.

O sistema brasileiro de direitos fundamentais e a possível descriminalização do aborto pela via jurisprudencial.

Por Davi de Lima Pereira da Silva - 08/07/2020 às 09:35

Sobre o autor:

Procurador-Geral do Município de Areal/RJ; Especialista em Direito Administrativo; Fundador e sócio licenciado do Escritório "Lima, Pacheco & Arruda Advogados Associados"; Pós-Graduando em Direito Constitucional, Direito Tributário, Direito Ambiental, Gestão Pública e Direitos Humanos.

“Principais aspectos relacionados à ADPF 442, que pleiteia a declaração de não recepção parcial dos artigos 124 e 126 do Código Penal para descriminalizar o aborto realizado no primeiro trimestre da gestação.

Resumo: O presente trabalho pretende analisar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº. 442, ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade, que pleiteia a declaração de não recepção parcial dos artigos 124 e 126 do Código Penal, para descriminalizar a prática abortiva no primeiro trimestre da gestação, e os possíveis caminhos a serem adotados pelo Supremo Tribunal Federal na ocasião deste julgamento, considerando o sistema constitucional de direitos fundamentais vigente em nosso país, a partir de uma análise da letra da Constituição e da legislação infraconstitucional, dos ensinamentos da doutrina a respeito dos direitos e garantias individuais e coletivos e dos precedentes do próprio STF em outras ações que envolveram a temática do aborto.

Palavras-chaves: Aborto. Nascituro. Gestante. Direitos Fundamentais”.

Citação na íntegra do artigo, na forma da NBR 6023:2018 ABNT. Fonte abaixo:

SILVA, Davi Lima Pereira. Considerações sobre a ADPF 442: O sistema brasileiro de direitos fundamentais e a possível descriminalização do aborto pela via jurisprudencial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6216, 8 jul. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/83782. Acesso em: 27 jul. 2023.

Adendo do Blog:

1. Em que pese um Brasil de 87% cristãos nominais, maioria contra o aborto, ainda crime no país (art. 124 do CPB), a Procuradoria Geral da República, Advocacia Geral da União - AGU, as duas casas Legislativas, todos foram contrários à ADPF 442, em 2018 e por último a PGR, em 12/05/2020, há risco de se aprovar no STF a legalização do aborto no atual contexto do avanço de "progressistas" contra a vida do nascituro.

2. Outro fator real e presente é a pressão de entidades internacionais pró-aborto, com representação no Brasil. Segundo a Gazeta do Povo, das 37 listadas para falar como amicus curiae (amigos da corte), todas provida são brasileiras, sem apoio de capital estrangeiro. E 14 são entidades estrangeiras ou financiadas por capitais internacionais, em favor do aborto.

3. No atual cenário está evidente o comprometimento da imparcialidade de denunciadores legais (MP) e julgadores, em torno do tema, com o Executivo, cuja bandeira apoia abertamente “pautas progressistas". A rigor, era para ter sido declarada a improcedência da ADPF 442 em tempo processual hábil. Servidores do Judiciário e MP, com o devido respeito, não foram aprovados em concurso para legislar e muito menos representar a vontade popular na República Federativa do Brasil. É tema de sensível repercussão nacional. É competência legislativa, não judiciária.

4. Somente, oração da Igreja e posicionamento público, ação de parlamentares e entidades provida atuantes, poderão manter no Brasil o aborto tal como é: Um crime contra a vida do nascituro, direito sagrado respaldado no artigo 5º, caput, do Texto Constitucional que assegura a inviolabilidade do direito à vida, sem distinção entre vida extra e intrauterina. E devidamente tipificado no Código Penal Brasileiro, recepcionado pela Constituição da República com status de lei ordinária.

5. Assim está posto, como afirmou o Deputado Rodrigo Maia, em ofício ao STF, no bojo da audiência pública em 2018, na discussão da ADPF 442, concluiu dizendo: “…nessa medida, o marco legal da criminalização do aborto está adequado. Protege-se a vida, a dignidade da pessoa humana, fundamento maior da República Federativa do Brasil, independente da fase em que a gestação se encontra, nos termos do artigo 5º, caput, da CF”. Ou seja, não se justifica “progredir” para matar nascituros indefesos no ventre da mãe. É uma insanidade civilizatória considerar o slogan “meu corpo, minhas regras”, em violação ao direito à vida do nascituro. E o aborto terapêutico, de casos anencéfalos, discussão já discorrida na ADPF 54/2004.

A vida no direito positivo brasileiro é um bem sagrada, do qual ninguém pode dele dispor para fazer o que quiser, sob pena de cometer um crime contra a vida, inclusive do bebê no ventre materno. 

Art. 2º do Código Civil – Lei 10.406, janeiro/2002 -  A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

Por Samuel Pereira de Macedo Borges

Bacharel em Direito e Teologia

Natal/RN, 28/07/2023.

sexta-feira, 28 de julho de 2023

Considerações sobre a ADPF 442 (Pró descriminalização do aborto no Brasil)

O sistema brasileiro de direitos fundamentais e a possível descriminalização do aborto pela via jurisprudencial.

 

Davi de Lima Pereira da Silva

08/07/2020 às 09:35

Principais aspectos relacionados à ADPF 442, que pleiteia a declaração de não recepção parcial dos artigos 124 e 126 do Código Penal para descriminalizar o aborto realizado no primeiro trimestre da gestação.

Resumo: O presente trabalho pretende analisar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº. 442, ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade, que pleiteia a declaração de não recepção parcial dos artigos 124 e 126 do Código Penal, para descriminalizar a prática abortiva no primeiro trimestre da gestação, e os possíveis caminhos a serem adotados pelo Supremo Tribunal Federal na ocasião deste julgamento, considerando o sistema constitucional de direitos fundamentais vigente em nosso país, a partir de uma análise da letra da Constituição e da legislação infraconstitucional, dos ensinamentos da doutrina a respeito dos direitos e garantias individuais e coletivos e dos precedentes do próprio STF em outras ações que envolveram a temática do aborto.

Palavras-chaves: Aborto. Nascituro. Gestante. Direitos Fundamentais.

Sumário: Introdução. 1. O Supremo e o Aborto. 1.1. A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 442. 1.2. O precedente da ADPF 54. 1.3. O precedente do HC nº 124.306/RJ. 2. O Sistema Constitucional Brasileiro de Direitos Fundamentais. 2.1. O Direito à Vida e o Princípio da Dignidade Humana. 2.2. O Código Penal como ferramenta de proteção aos direitos fundamentais. 2.3. O crime de aborto e os direitos do nascituro. 3. Quando os direitos entram em conflito. Conclusão. Referências Bibliográficas.

Introdução

Há, na sociedade brasileira, um crescente movimento pela descriminalização da conduta abortiva nos três primeiros meses da gestação, sob o fundamento de que os direitos de escolha da mulher deveriam se sobrepor aos direitos do ser intrauterino. Tem-se, dessa maneira, um claro e evidente conflito de bens jurídicos: de um lado, os direitos femininos de autodeterminação; de outro, o direito à vida do produto da concepção.

O Supremo Tribunal Federal já se manifestou duas vezes sobre este conflito, através de uma decisão plenária na ADPF 54, que culminou na descriminalização do aborto dos fetos anencéfalos; bem como em uma decisão de turma no HC 124.306/RJ, em que três Ministros se manifestaram expressamente pela inconstitucionalidade da criminalização do aborto nos três primeiros meses da gravidez.

O próximo passo será dado no julgamento da ADPF 442, ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade, que busca a declaração de não recepção parcial dos artigos 124 e 126 do Código Penal, a fim de descriminalizar a conduta abortiva nos três primeiros meses da gestação, feito que já se encontra próximo do julgamento, já tendo ocorrido audiência pública com diversos atores sociais para debater o tema.

Em razão do precedente do HC 124.306/RJ, em que três Ministros entenderam pela descriminalização do aborto nos três primeiros meses gestacionais, pode ser que o Supremo esteja caminhando neste sentido, motivo pelo qual este estudo analisará qual seria a melhor decisão a ser tomada pela Corte na ocasião do julgamento da ADPF supramencionada, considerando todo nosso sistema constitucional de proteção aos direitos fundamentais, a partir de lições da doutrina e da jurisprudência a respeito do princípio da dignidade humana, dos direitos de liberdade da mulher e do direito à vida do nascituro.

1. O Supremo e o Aborto

O Supremo Tribunal Federal é a corte máxima do sistema judiciário pátrio, sendo a responsável por declarar a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, a fim de preservar a compatibilidade do ordenamento jurídico brasileiro com os princípios e regras estabelecidos pela Constituição Federal de 1988.

Assim, tem-se que o instituto do aborto, figura prevista como crime pelos artigos 124, 125 e 126 do Código Penal, e que parte da sociedade entende que não deveria ser criminalizada nos três primeiros meses da gestação, inevitavelmente teria que ser enfrentada pelo STF, a fim de estabelecer uma solução definitiva acerca da compatibilidade, ou não, do referido tipo penal com o sistema constitucional brasileiro.

Por duas ocasiões, o Supremo já se manifestou sobre o tema: Na ADPF 54, a Corte entendeu pela descriminalização da interrupção da gestação quando o feto for anencéfalo, por entender que a hipótese não seria de crime contra a vida, visto que vida pressupõe atividade cerebral; e no HC 124.306/RJ, em que três ministros manifestaram entendimento no sentido de que a criminalização da interrupção do parto nos três primeiros meses da gravidez seria incompatível com o sistema constitucional vigente, motivo pelo qual os artigos 124 e 126 do Código Penal, que estabelecem as hipóteses de auto-aborto e aborto consentido pela gestante, não teriam sido recepcionados em sua integralidade pela Constituição de 1988.

Essa última decisão, no entanto, não se reveste de efeito vinculante, visto que foi proferida em sede de controle concreto, gerando efeito somente para as partes do processo. Ou seja, o aborto permanece sendo crime em qualquer fase da gestação. No entanto, já tramita no Supremo Tribunal Federal uma ação de controle abstrato de constitucionalidade, buscando uma decisão com efeito erga omnes acerca da questão. Trata-se da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº. 442, ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), que pode representar um grande marco histórico da nossa jurisprudência.

1.1. A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 442

A Arguição de Descumprimento de Prefeito Fundamental (ADPF) está prevista no artigo 102, parágrafo primeiro, da Constituição de 1988, e é uma ação proposta exclusivamente perante o Supremo Tribunal Federal, cujo objetivo é evitar, ou reparar, lesão a preceito fundamental estabelecido pela Constituição, resultante de ato do poder público, ou então questionar a constitucionalidade de alguma norma que, supostamente, desrespeite tal preceito.

Na ADPF 442, ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), questiona-se que a criminalização da interrupção do parto nos três primeiros meses da gestação desrespeitaria preceitos fundamentais relacionados à dignidade da mulher, motivo pelo qual pleiteia-se a declaração de não recepção parcial dos artigos 124 e 126 do Código Penal, para descriminalizar a conduta durante este período de 12 semanas.

A referida ação, subscrita pelas advogadas Luciana Boiteux, Luciana Genro, Gabriela Rondon e Sinara Gumeri, tem como relatora a Ministra Rosa Weber, e se fundamenta quase que exclusivamente nos direitos de liberdade das mulheres, fazendo uso de muitas fontes do direito comparado, com a menção a vários países que regulamentaram o aborto, sem, no entanto, entrar no mérito sobre quando começa a vida humana. Ou seja, pretende-se que seja reconhecido que os direitos reprodutivos femininos teriam maior expressão jurídica do que o direito à vida do nascituro.

Na petição inicial da ADPF, a arguente menciona diversas vezes o exemplo do sistema jurídico dos Estados Unidos, que, a partir da decisão proferida no caso “Roe vs Wade”, passaram a autorizar a prática abortiva em todos os seus Estados. O referido processo tinha como parte requerente a norte-americana Norma McCovery, conhecida pelo pseudônimo “Jane Roe”, que demandou contra o Estado do Texas com a finalidade de conseguir autorização para interromper sua gestação, alegando que teria sido vítima de relação sexual forçada por Henry Wade, um funcionário público do Condado de Dallas. A ação acabou chegando à Suprema Corte dos Estados Unidos, que, no ano de 1973, quando a criança fruto da relação já tinha nascido e sido entregue à adoção, proferiu acórdão histórico, relatado pelo Juiz Harry Blackmun, que firmou o precedente adotado até hoje no sistema jurídico norte-americano, no sentido de que a mulher, amparada pelo seu direito à privacidade, garantido pela décima-quarta emenda à Constituição dos Estados Unidos da América, tem liberdade para decidir pela continuidade ou não de seu processo gestacional, o que, na prática, legalizou o aborto no território norte-americano.

Um fato curioso é que, no ano de 1987, Jane Roe admitiu que não havia sido vítima de violência sexual, e que teria inventado a história, sob orientação de suas advogadas, para que conseguisse autorização para abortar, visto que, na época, as leis do Texas não permitiam o aborto e ela não dispunha de recursos financeiros para viajar para outro estado para realizar o procedimento.

O paradigma norte-americano, portanto, se baseia na ideia de que a proibição do aborto violaria os direitos à privacidade da gestante e, por isso, a conduta foi descriminalizada quando realizada no primeiro trimestre da gestação.

Esse entendimento, pelo menos até a presente data, não cabe em nosso sistema jurídico, pois, no ordenamento normativo dos Estados Unidos, percebe-se uma relativização do direito à vida que não encontra espaço no Brasil, conforme será abordado mais adiante.

Ou seja, no direito norte-americano a liberdade da mulher seria um valor jurídico com maior expressão do que a vida do nascituro, entendimento que, por enquanto, não é acolhido pelo ordenamento jurídico brasileiro, embora seja o que pretende a ADPF nº. 442.

Dentre os argumentos levantados pelas advogadas subscritoras da arguição, estão o de que “a criminalização do aborto e a consequente imposição da gravidez compulsória compromete a dignidade da pessoa humana e a cidadania das mulheres, pois não lhes reconhece a capacidade ética e política de tomar decisões reprodutivas relevantes para a realização de seu projeto de vida”, bem como “provoca violações ao direito à saúde (CF, art. 6º), à integridade física e psicológica das mulheres e à proibição de submissão a tortura ou a tratamento desumano ou degradante (CF, art. 5º, III), uma vez que a negação do direito ao aborto pode levar a dores e sofrimentos agudos para uma mulher, ainda mais graves e previsíveis conforme condições específicas de vulnerabilidade que variam com a idade, classe, cor e condição de deficiência de mulheres, adolescentes e meninas”. Ou seja, o objetivo da ADPF é que o Supremo Tribunal Federal reconheça que os direitos de escolha da mulher devem se sobrepor aos direitos do nascituro.

Em razão da grande relevância da matéria, a Ministra Rosa Weber convocou audiência pública para tratar do tema, o que ocorreu nos dias 03 e 06 de agosto de 2018, com a presença de especialistas da área da saúde, de movimentos feministas, de partidos políticos, de entidades religiosas, entre outros grupos representativos.

Atualmente, o último movimento do processo é uma manifestação da Procuradoria Geral da República, do dia 12 de maio de 2020, da lavra do Procurador-Geral, Augusto Aras, pugnando pela improcedência da ADPF. Neste parecer, o Procurador afirma que o Supremo Tribunal Federal não pode atuar como legislador positivo, e que a matéria cabe ao Congresso Nacional. Acrescenta, ainda, que, diante de diferentes correntes científicas acerca do marco inicial da vida humana, cabe ao poder legislativo, que é o órgão legitimamente constituído para representar a vontade da população, decidir qual seria este marco, seguindo, é claro, pareceres técnicos de especialistas no assunto.

Compete destacar que o poder legislativo também foi instado a se manifestar no feito, tendo a Câmara dos Deputados apresentado parecer no sentido de que a constitucionalidade dos artigos 124 e 126 do Código Penal já foi reafirmada pelas comissões temáticas daquela Casa Legislativa na ocasião da apreciação de alguns projetos de lei que versavam sobre o referido tipo penal. A manifestação reafirma, ainda, que o tipo penal do aborto protege o mais fundamental dos direitos garantidos pela Constituição, que, ao não delimitar etapa específica da gestação, garantiu a proteção em qualquer fase que o nascituro se encontre.

Nas palavras do Deputado Rodrigo Maia, que assinou o ofício encaminhado ao STF, “faz-se mister salientar que crime de aborto previsto nos artigos 124 e 126 do Decreto-Lei n. 2.848/1940 está inserido, no Código Penal, no título dos crimes contra as pessoas, no capítulo dos crimes contra a vida. Percebe-se, pois, que os delitos em questão possuem como bem jurídico a ser tutelado a vida humana intrauterina. Assim, a prática do crime de aborto significa atentar contra a vida, direito fundamental inviolável, resguardado pelo artigo 5º, caput, da Constituição Federal – CF, dispositivo este que não faz distinção entre a vida extra e intrauterina. (…) Nessa medida, o marco legal da criminalização do aborto está adequado. Protege-se a vida, a dignidade da pessoa humana, fundamento maior da República Federativa do Brasil, independente da fase em que a gestação se encontra, nos termos do artigo 5º, caput, da CF.”

A outra Casa Legislativa, o Senado Federal, também se manifestou no processo, igualmente rechaçando a tese proposta na ADPF, tendo registrado que o Código Civil (Lei 10.406/2002) foi editado sob a égide da Constituição de 1988, e consagra, em seu artigo 2º, a proteção aos direitos do nascituro, o que evidencia que a constitucionalidade da tutela jurídica do ser intrauterino já foi referendada pelo poder legislativo.

Percebe-se, portanto, que as duas casas do Congresso Nacional tecem argumentos no sentido de que o direito fundamental à vida do nascituro merece maior proteção do que os direitos reprodutivos da mulher, bem como de que, na ausência de marco legal expresso acerca do início da vida humana, deve prevalecer a proteção constitucional desde a concepção.

A Presidência da República e a Advocacia Geral da União também se manifestaram na ação, tendo, igualmente, pugnado pela improcedência da ADPF. Na manifestação da Presidência, subscrita pela Advogada da União, Dra. Raquel Barbosa de Albuquerque, também se defende que a matéria seja discutida pelo legislativo, não podendo o Supremo Tribunal Federal atuar como legislador e criar mais uma hipótese de excludente de criminalização, já que o aborto é crime contra a vida. Já a manifestação da AGU, subscrita pela então Advogada-Geral, Dra. Grace Mendonça, foi ainda mais contundente, aduzindo que, além do STF não poder atuar como legislador positivo, o nosso sistema constitucional coloca o direito à vida do nascituro em patamar superior aos direitos de liberdade da mulher, tendo acrescentado, ainda, que, como nosso ordenamento não definiu qual seria o marco inicial da vida humana, se impõe sua proteção desde a concepção, devendo ser rechaçada a “solução de prazo” mencionada na ADPF, em uma referência ao pedido de descriminalização da conduta abortiva no primeiro trimestre da gestação.

Nas palavras da advogada-geral, “a decisão legislativa de fazer prevalecer, como regra, o direito à vida do feto em detrimento do direito de escolha da mulher é compatível com a Constituição da República” e “com efeito, embora a Lei Maior não contenha disposição específica a respeito do aborto, cumpre notar que o artigo 5º, caput, do Texto Constitucional assegura a inviolabilidade do direito à vida. Nesse aspecto, o Código Penal, no que diz respeito à tipificação dos crimes contra a vida, foi recepcionado pela Constituição da República com status de lei ordinária”.

Fica evidente, portanto, que a manifestação do Congresso Nacional, da Advocacia Geral da União e da Procuradoria-Geral da República afirmam que o direito à vida do nascituro possui proteção constitucional mais acentuada do que os direitos femininos de escolha, e que, na ausência de previsão legal acerca do momento em que a vida se inicia, deve prevalecer o entendimento pela proteção constitucional em qualquer fase gestacional, até que este marco inicial seja estabelecido em nosso ordenamento.

O cenário, portanto, é de incógnita, pois, embora as demais instituições tenham se manifestado de forma contrária ao que foi pleiteado na ADPF, já é tido como certo que três ministros votarão pela procedência da arguição, em razão de seus posicionamentos no HC 124.306/RJ, que será abordado mais adiante. Antes, porém, compete destacar a primeira abordagem do Supremo acerca do aborto: a hipótese de gestação de fetos anencéfalos.

1.2. O precedente da ADPF 54/2004

No ano de 2004, a Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde, através do então advogado Luís Roberto Barroso, atual Ministro do STF, ajuizou Arguição de Descumprimento de Prefeito Fundamental para questionar a criminalização da antecipação do parto do feto anencéfalo, sob o argumento de que isso violaria os preceitos fundamentais relacionados a dignidade da mulher sem representar qualquer proteção à vida do feto, visto que, sem perspectiva de atividade cerebral, não há vida a ser protegida, de modo que a interrupção antecipada da gestação nesse caso sequer poderia ser considerada como aborto.

Segundo a literatura médica, a anencefalia é definida como a má-formação do cérebro e do córtex do feto, havendo apenas um "resíduo" do tronco encefálico. Segundo a Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde (CNTS), esta anomalia provoca a morte de 65% dos bebês ainda dentro do útero materno e, quando conseguem chegar ao nascimento, há sobrevida de apenas algumas horas, ou, no máximo, alguns poucos dias.

Nesse cenário, tem-se uma gravidez em que não há a menor expectativa de vida para o produto da concepção, situação em que levar a gestação até o fim serviria apenas para provocar um sofrimento irreparável na gestante, motivo pelo qual a confederação dos trabalhadores da saúde buscou, através da ADPF 54, questionar os artigos 124, 126 e 128 do Código Penal, que criminalizam a conduta abortiva e dispõe como únicas possibilidades de excludentes de ilicitude os casos de gravidez com risco de vida para a gestante e gravidez decorrente de estupro. Pleiteava a ação que o aborto do anencéfalo fosse descriminalizado, passando a ser considerado como antecipação terapêutica do parto, visto que a tipificação desta conduta como crime descumpriria os preceitos fundamentais da dignidade humana e da proteção à maternidade. No entendimento da CNTS, não haveria que se falar em aborto conforme o regulado na lei penal, visto que não se trata de eliminação da vida intrauterina, uma vez que o anencéfalo não possui nenhuma expectativa de sobreviver.

Outra argumentação utilizada foi a invocação do princípio da legalidade, estampado no inciso II do artigo 5º da Constituição, que determina que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer nada senão em virtude da lei. Ora, se, conforme o alegado pela CNTS, não pode se falar em aborto quando se tratar de feto anencéfalo, visto que o aborto é um crime contra a vida e nesse cenário não há expectativa alguma de sobrevivência, não pode haver criminalização de uma conduta que não estaria prevista, uma vez que a lei penal se refere a aborto e a conduta objeto da ADPF seria antecipação terapêutica do parto, segundo entendimento dos proponentes.

Em suma, a CNTS alegava que o anencéfalo não tem condições nenhuma de sobreviver, e como o Código Penal, ao criminalizar o aborto, busca a preservação da vida humana, a interrupção da gestação de feto anencefálico não poderia de forma alguma ser considerada crime.

Embora a ADPF tenha sido proposta em 2004, o processo teve seu julgamento iniciado apenas no dia 11 de abril de 2012, sendo encerrado no dia seguinte, com a vitória da tese levantada pela CNTS, por oito votos a dois. Na ocasião, a Corte era formada pelos Ministros Celso de Mello, Marco Aurélio de Mello, Cezar Peluso, Carlos Ayres Britto, Gilmar Mendes, Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski, Carmem Lúcia, Rosa Maria Webber, Luiz Fux e Dias Toffoli.

A manifestação favorável de grande maioria da Corte demonstrou que o Supremo compartilha do entendimento de que o aborto de feto anencéfalo sequer pode ser considerado aborto, visto que este é um crime contra a vida e o feto anencefálico jamais terá vida em potencial. Assim, prevaleceu a tese de que a interrupção da gestação em casos de anencefalia não é conduta abortiva, e sim, antecipação terapêutica do parto.

O foco central do voto de todos os ministros foi o direito constitucional à vida garantido ao nascituro. Os oito que votaram a favor da tese levantada pela CNTS alegaram que a descriminalização da interrupção antecipada do parto em casos de anencefalia não viola este preceito, visto que o feto anencéfalo não tem expectativa alguma de vida e a morte ocorre em 100% dos casos, sendo a maioria dentro ainda do útero materno.

O relator do processo, ministro Marco Aurélio de Melo, considerou que “anencefalia e vida são termos antitéticos”. Segundo ele, não há conflito entre direitos fundamentais, uma vez que não há qualquer possibilidade do feto anencéfalo sobreviver fora do útero. Em seu voto, o relator sustentou que a arguição proposta pela CNTS não se refere à descriminalização do aborto, uma vez que existe uma clara distinção entre este e a antecipação de parto no caso de anencefalia. Nas palavras do ministro, “Aborto é crime contra a vida. Tutela-se a vida potencial. No caso do anencéfalo, não existe vida possível”. Ele destacou ainda que não se trata realmente de um nascituro, mas sim de um natimorto.

Na mesma linha se posicionou Celso de Mello, que afirmou o seguinte: “Se não há, na hipótese, vida a ser protegida, nada justifica a restrição aos direitos da gestante”. O ministro mencionou em seu voto a Lei 9.434/97 e a Resolução 1.752/97 do Conselho Federal de Medicina, que consideram a morte do ser humano como o momento em que se encerra completamente sua atividade cerebral, ou seja, a morte encefálica. Segundo ele, seria perfeitamente possível fazer uma analogia no sentido de afirmar que o anencéfalo não é um ser humano vivo, pois não possui cérebro e jamais desenvolverá atividade cerebral. Dessa maneira, não existe crime de aborto possível, pois este é um delito contra a vida e, segundo suas palavras, “se não há vida a ser protegida, não há tipicidade”.

Seguindo a mesma tendência, a ministra Rosa Maria Weber afirmou que a anencefalia não é compatível com as características de compreensão de vida para o Direito e por isso a interrupção de gravidez de feto anencéfalo não pode ser considerada aborto, visto que não é crime contra a vida. A ministra, assim como Celso de Mello, fez alusão à questão da falta de atividade cerebral do feto, relembrando o conceito de morte para o Conselho Federal de Medicina. Carmem Lúcia, por seu turno, fez a seguinte afirmação: “Considero que na democracia a vida impõe respeito. Neste caso, o feto não tem perspectiva de vida e, de toda sorte, há outras vidas que dependem, exatamente, da decisão que possa ser tomada livremente por esta família [mãe, pai] no sentido de garantir a continuidade livre de uma vida digna”.

E essa foi a tendência da maioria dos ministros. Os únicos a votarem contra o requerido pela CNTS foram Ricardo Lewandowski e Cezar Peluso. O primeiro, argumentou que o Supremo não pode criar uma nova possibilidade jurídica, uma vez que isto é atribuição do legislativo. Já o segundo, defendeu a tese que o anencéfalo também é sujeito de direitos, e, por isso, destinatário do direito constitucional à vida. Segundo suas palavras, “A vida não é um conceito artificial criado pelo ordenamento jurídico para efeitos operacionais. A vida e a morte são fenômenos pré-jurídicos das quais o direito se apropria para determinado fim”.

No mais, Luiz Fux, Ayres Britto e Joaquim Barbosa votaram favoravelmente a tese da CNTS, afirmando que não se trata de aborto, e sim de interrupção antecipada do parto, visto que o anencéfalo não tem chance alguma de ter vida viável. Gilmar Mendes também se posicionou a favor da descriminalização da conduta, no entanto entendeu que se trata de aborto sim, porém deve ser enquadrado como hipótese de excludente de ilicitude. Assim foi construído o placar de 8 a 2. O ministro Dias Toffoli não votou, pois se declarou impedido em razão de ter trabalhado no parecer da Advocacia-Geral da União em favor do pleiteado, na época em que era o advogado-geral.

Outro ponto que merece destaque neste julgamento é a sustentação do então advogado Luís Roberto Barroso, atual Ministro do Supremo e patrono da CNTS naquele feito. Na ocasião, Barroso que afirmou não se tratar de caso de aborto, uma vez que este tipo penal pressupõe vida, o que é impossível em casos de anencefalia. Nesse cenário, só estão em jogo os direitos fundamentais da gestante. Segundo suas palavras, “A mulher não sairá da maternidade com um berço. Sairá da maternidade com um pequeno caixão. E terá de tomar remédios para cessar o leite que produziu para ninguém. É uma tortura psicológica”. Ele afirmou ainda que todas as autoridades médicas garantem que o diagnóstico de anencefalia é 100% certo e a letalidade ocorre em 100% dos casos, conforme documentos anexados aquele processo.

Ou seja, todo o julgamento se pautou pela questão do direito constitucional à vida. A tese levantada pela CNTS foi de que não há vida viável para o nascituro, e foi essa a argumentação de todos os ministros que votaram a favor da descriminalização.

Para alguns ministros, este foi o julgamento mais importante da história da Corte. Um julgamento que, ao descriminalizar a interrupção antecipada do parto em casos de fetos anencéfalos, reafirmou para toda a sociedade que a Constituição Federal e todo o ordenamento que por ela é comandado protegem a vida humana, que, nesse caso, não estava em jogo. O Supremo, na verdade, não criou uma nova excludente de ilicitude para o aborto, e sim confirmou que este é um crime contra a vida, e como não há vida a ser protegida em casos de anencefalia, a antecipação do fim da gestação não pode ser definida como conduta criminosa.

1.3. O precedente do HC 124.306/RJ

O Jurista Luís Roberto Barroso, que foi advogado da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde na ADPF acima mencionada, que culminou na descriminalização da interrupção da gravidez do feto anencéfalo, se tornou Ministro do Supremo Tribunal Federal em 26 de junho de 2013, por indicação da então presidenta Dilma Roussef. Seu ingresso na Corte representou uma conquista para os defensores da legalização do aborto, visto que suas posições a respeito do tema são consideradas “progressistas”, indicando que, em seu entendimento, a vida humana não se inicia no momento da concepção, o que abre espaço para a descriminalização da conduta abortiva antes que o feto alcançasse esse estágio em que a vida começa.

O Ministro deixou claro esse entendimento ao proferir, no Habeas Corpus nº. 124.306/RJ, um voto-vista que pode representar o primeiro passo do direito brasileiro no rumo da legalização do aborto nas primeiras semanas da gestação.

O Habeas Corpus em questão foi impetrado para requerer liberdade provisória a dois pacientes presos preventivamente em decorrência da prática abortiva. O feito foi relatado originalmente pelo Ministro Marco Aurélio de Melo, que votou para conceder a ordem, em razão da ausência de fundamentos para a prisão preventiva.

O Ministro Barroso, no entanto, proferiu voto-vista no sentido de não conhecer do remédio, por se tratar de substitutivo de recurso ordinário constitucional, mas de conceder a ordem de ofício, para determinar a soltura dos pacientes, em razão da relevância da matéria. Esse voto, que será detalhado no parágrafo seguinte, foi seguido pelos outros membros da turma, Ministros Edson Fachin e Rosa Weber, sendo vencido somente o Ministro Marco Aurélio, motivo pelo qual o Ministro Barroso foi alçado ao posto de relator do acórdão, na forma do artigo 38, inciso II, do Regimento da Corte, que determina a substituição do relator quando este for vencido em seu voto.

Em sua manifestação, o Ministro Barroso deixou claro seu posicionamento no sentido de que, no primeiro trimestre da gestação, a prática abortiva não poderia ser considerada crime, visto que isso violaria direitos fundamentais da mulher, a exemplo do que foi consignado no precedente norte-americano de “Roe vs. Wade”, já citado neste trabalho.

Nas palavras do Ministro, “é dominante no mundo democrático e desenvolvido a percepção de que a criminalização da interrupção voluntária da gestação atinge gravemente diversos direitos fundamentais das mulheres, com reflexos inevitáveis sobre a dignidade humana. O pressuposto do argumento aqui apresentado é que a mulher que se encontre diante desta decisão trágica – ninguém em sã consciência suporá que se faça um aborto por prazer ou diletantismo – não precisa que o Estado torne a sua vida ainda pior, processando-a criminalmente. Coerentemente, se a conduta da mulher é legítima, não há sentido em se incriminar o profissional de saúde que a viabiliza”.

Na sequência, o Ministro passou a abordar a condição jurídico-científica do nascituro no primeiro trimestre da gestação, mostrando ser um adepto da corrente que sustenta que só há que se falar em vida quando se forma o sistema nervoso central, o que ocorre após o terceiro mês da gestação. Em suas palavras, não poderia haver a criminalização do aborto nos três primeiros meses gestacionais, pois “não há qualquer possibilidade de o embrião subsistir fora do útero materno nesta fase de sua formação. Ou seja: ele dependerá integralmente do corpo da mulher”.

Partido dessa premissa, o Ministro avançou em seu voto, sustentando que a interrupção do parto não poderia ser considerada crime nos três primeiros meses da gestação, tendo mencionado diversos argumentos geralmente invocados por movimentos defensores da legalização do aborto, tais como: (I) a criminalização da conduta viola os direitos sexuais, reprodutivos e de planejamento familiar da mulher; (II) viola o princípio da igualdade, pois homem não engravida; (III) atinge mais as mulheres pobres, que, por não terem condições financeiras para custear um aborto seguro, acabam procurando clínicas clandestinas e põe sua vida em risco, enquanto as que possuem padrão financeiro mais elevado realizam a prática com segurança; e (IV) não contribui efetivamente para coibir o aborto, pois estudos de países que legalizaram a interrupção gestacional demonstram que a prática não aumentou com a legalização.

Em razão destes fundamentos, o Ministro votou para conceder, de ofício, a ordem de habeas corpus, fundada não só na desnecessidade da prisão preventiva no caso concreto, mas também na tese de que os artigos 124 e 126 do Código Penal, em sua opinião, não teriam sido recepcionados em sua integralidade pela Constituição de 1988, uma vez que não deveriam incidir sob a interrupção do parto praticada até o terceiro mês da gestação.

O posicionamento do Ministro Barroso foi acompanhado pelos Ministros Edson Fachin e Rosa Weber em todos os seus termos, o que demonstra que, pelo menos, três membros de nossa Corte Suprema entendem pela descriminalização da interrupção antecipada no parto até a terceira semana da gestação, hipótese em que o feto ainda não possui função cerebral e, portanto, não possuiria vida plena.

Essa decisão não gerou efeito vinculante, visto que foi proferida nos autos de um Habeas Corpus, configurando controle concreto/difuso de constitucionalidade. No entanto, embora só tenha produzido efeito entre as partes, o fato de ter sido acompanhada por mais dois Ministros desperta na sociedade a expectativa de que a ADPF, ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade, possa ter um desfecho de procedência, o que representaria a descriminalização da prática nos três primeiros meses da gestação, visto que a decisão em uma ação de controle abstrato, como é a ADPF, gera efeito para todos.

Assim, considerando que a ADPF em questão parece estar próxima de seu julgamento, compete analisar o ordenamento constitucional brasileiro como um todo, a fim de delimitar qual seria a decisão mais acertada a respeito da descriminalização do aborto, de acordo com nosso sistema de proteção de direitos fundamentais.

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Sobre o autor:

Davi de Lima Pereira da Silva

Procurador-Geral do Município de Areal/RJ; Especialista em Direito Administrativo; Fundador e sócio licenciado do Escritório "Lima, Pacheco & Arruda Advogados Associados"; Pós-Graduando em Direito Constitucional, Direito Tributário, Direito Ambiental, Gestão Pública e Direitos Humanos.

Citação na forma da NBR 6023:2018 ABNT.

SILVA, Davi Lima Pereira. Considerações sobre a ADPF 442:: O sistema brasileiro de direitos fundamentais e a possível descriminalização do aborto pela via jurisprudencial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6216, 8 jul. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/83782. Acesso em: 27 jul. 2023.

Publicação na íntegra com grifos do blogueiro.

Natal/RN, 27/07/2023.

terça-feira, 25 de julho de 2023

O cristão e a comemoração de aniversários.


Em eventos de aniversário, que se dizem cristãos, em geral, lembram: figuras da Disney, heróis em quadrinhos e desenhos animados, cultura chinesa, Tik-tok, animais, frutas, paganismo (festas das bruxas, mitos e deuses mitológicos), temas neutros como, o astronauta, futebol e profissões, etc. Quem procurar temas realmente cristãos vai encontrar, uma vez que a Bíblia é uma fonte rica disponível (a criação, a arca de Noé, o homem a imagem de Deus, amor, fé, a natureza, felicidade em Cristo, família com Cristo, personagens bíblicos, histórias bíblicas reais...), que promovem valores da fé cristã e não mitos e entretenimentos mundanos, muitos deles com mensagens subliminares, outros descaradamente anticristãos.

É possível considerar, valorizar o imaginário infantil sem contribuir com a cultura do engano, com o pai da mentira no presente século.

O modelo da Educação Judaica

Deuteronômio 6.4-9

“Escute, Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único Senhor. Portanto, ame o Senhor, seu Deus, de todo o seu coração, de toda a sua alma e com toda a sua força. Estas palavras que hoje lhe ordeno estarão no seu coração. Você as inculcará a seus filhos, e delas falará quando estiver sentado em sua casa, andando pelo caminho, ao deitar-se e ao levantar-se. Também deve amarrá-las como sinal na sua mão, e elas lhe serão por frontal entre os olhos. E você as escreverá nos umbrais de sua casa e nas suas portas”.

Se em tempos remotos (+-1.400 a.C.), no paganismo primitivo, a nação de Israel era assim instruída por um profeta e legislador que com Deus falava “cara a cara”, que dirá nos dias atuais com ataques de várias frentes ideológicas, onde a informação, o conhecimento bom e o ruim, correm velozmente, a verdade de Deus (absoluta), relativizada, a pecaminosidade multiplicada, o amor esfriando, todo um contexto mais complexo.

Que em momentos oportunos, de entretenimentos, comemorações de vitórias sejamos sábios geradores de boas memórias da fé cristã, principalmente, nas crianças com demonstrações ativas, públicas de gratidão a Deus. E que também tem um condão evangelizador, sem longos discursos. Para quem não conhece o evangelho, pode estar vivendo só de religiosidade, sem segurança de salvação em Cristo.

Pontos Fundamentais

1. A escola escolariza, prepara para o mercado de trabalho. No lar a criança deve ser educada moral e espiritualmente. É missão dos pais e a igreja auxilia nesse papel. Infelizmente há lares ditos cristãos que pais não buscaram, não buscam instrução com convicção, sólida nem para eles, muito menos para os filhos. Aí dizem os críticos: “As cadeias estão cheias de filhos de crentes e tem até nomes bíblicos”.

Pv 22.6 - A promessa é: “Ensina o menino no caminho (com ele no caminho) em que deve andar, e até quando envelhecer não se desviará dele”.

2. O fator livre arbítrio – Cada pessoa, via de regra, tem a capacidade de tomar decisões e fazer escolhas. O justo é que cada um dará conta de si mesmo a Deus, seja normal ou deficiente intelectual, humilde para aprender ou orgulhoso, fazendo-se dono do seu destino.

3. A constituição da unidade familiar – É de vital importância não está dividido em dois mundos espirituais – Um do Deus de amor presente e atuante, no outro um inimigo feroz e destruidor. Está em Cristo ou sem Cristo faz toda a diferença. É uma questão pessoal confessional e não comporta neutralidade. Porém, afeta a família. Disse Jesus: “Quem não é por mim é contra mim; e quem comigo não ajunta espalha” (Mt 12.30). Esse ponto tem implicações, por conseguinte, desafios na educação e formação cristã familiar.

4. Não queime etapas – Temos a infância, adolescência e adentramos a vida adulta. É importante cada ser humano vivenciar cada uma delas. Respeitar esses momentos, aproveitar o máximo delas equilibradamente. Nem todos os lares tem um ambiente favorável. Outros exageram permitindo as crianças fazerem tudo que querem, têm presentes aos montes, não são ensinadas a orar, ignoram as Escrituras, não valorizam a Igreja, maior agência do Reino de Deus na terra instituída por Jesus, enfim não aprendem do Criador sobre suas vidas, etc. e muitos casos em lares cristãos.

Concluindo, vivemos num mundo hostil à fé cristã como nunca antes e tende a piorar. É uma insanidade atrás da outra na política ideológica notadamente.  Vivemos a cultura contra a vida e do cancelamento: Não concorda comigo? É meu inimigo! Exclui dos contatos, bloqueia nas suas redes sociais. Sociedade do descartável, relacionamentos superficiais, ora abusivos, amizades são apenas conexões...

João 10.10 – “O ladrão vem para roubar, matar e destruir. Eu vim para lhes dar vida, uma vida plena, que satisfaz” (NVT).

O cristão e discípulo precisa vigiar para não ficar inerte por causa do sincretismo (frágil consenso parcial de pensamentos e ideias incongruentes), e da tolerância religiosa, tornando-se uma testemunha muda de Jesus, e não pregar, anunciar o evangelho, poder de Deus e salvação para todo o que crê. Obviamente, vai na frente o bom testemunho cristão.

 

Por Samuel P M Borges

Bacharel em Direito e Teologia

Natal/RN, 25/07/2023.

domingo, 23 de julho de 2023

Quando a criatura vale mais do que o Criador.

Texto: Rm 1.18-25


Introdução: Neste estudo, veremos vários sistemas de ideias e pensamentos, de construção humana no curso da história na medida em que as Escrituras são desprezadas, tiram Deus de cena e o homem passa a ser ator principal. É o homem, na sua soberba e insensatez, se afastando do Deus da verdade. 

I - O desprezo à verdade

Rm 1.18 – “A ira de Deus se revela do céu contra toda impiedade e perversão dos homens que detêm a verdade pela injustiça”.

O termo impiedade (no grego asebeia) - Significa irreligiosidade, ou seja, o homem decidiu, escolheu viver como se Deus não existisse (Sl 14.1;36.1; Jd 1.14-15). E mais triste, tem Deus nos lábios, em lindas frases, mas no espírito e alma, nenhuma relação com Ele.

O vocábulo injustiça (do grego adikia) -  Significa sem retidão, com a conotação de não ser reto diante de Deus e nem com o seu próximo (II Pd 2.15).

Eis a razão porque Paulo descreve uma humanidade pagã, degenerada, idólatra, perversa, moralmente depravada e cultuando à criatura, ao invés do Criador (Rm 1.18-25).

A insensatez humana - Cegou o mundo gentio, quando Deus pela revelação geral, através da natureza, deu condições do homem o conhecer o seu Criador e receber conhecimento a seu respeito, deixando-os inescusáveis (Rm 1.20b). Estão indesculpáveis diante de Deus.

Nos tempos atuais, a ciência, a matéria tem sido posta acima de Deus. Na vida social, o artista, o atleta, o ator de novelas destrutivas, que nada edifica, líderes religiosos não exemplares, se tornam referências, uma verdadeira afronta ao Criador.

Verdade é - Homens no paganismo procedem ímpia e injustamente e detém a verdade em injustiça. Mudaram a verdade de Deus em mentira, honram e servem mais a criatura do que ao Criador, que é bendito eternamente (Rm 1.18,25).

II – A Revolução do Pensamento Humano

Renascentismo – Movimento intelectual na Europa Ocidental entre os séculos XIV e XVI, a partir das artes, literatura e criação da imprensa. Ressurgia o humanismo, através da crítica literária e se buscava explicações dos fenômenos sociais.

Antes, lembramos o que dizia o sofista Protágoras de Abdera (480-410 a.C.): “O homem é a medida de todas as coisas”. E daí foi tomando corpo a relativização da verdade.  Ensinavam os sofistas: Cada pessoa pode decidir o seu próprio padrão para o certo e o errado. O que é moralmente certo para mim, pode estar errado para outro.

Idade Média – Anos 500 a 1500 – Após a queda do Império Romano Ocidental (476 d.C.). Tempos de Cristandade, a religião focada no poder político-religioso e pouco Cristianismo. No século XVIII, os iluministas a nominaram de a Idade das Trevas.

Idade Moderna – Século XV ao XVIII – A partir da queda do Império Romano Oriental (330-1453 d.C.) - O sultão Mohammed II, o Conquistador, invadiu Constantinopla (antiga Bizâncio) e eliminou Constantino XI, o último imperador bizantino, após um cerco de 53 dias.

Para outros historiadores, a Era Moderna - Começou no século XVII, a partir da Guerra dos 30 anos (1618-1648), envolvendo império católico-germânico e protestantes, na Europa central (Alemanha, França, Espanha, Países Baixos, Boêmia (atual Tchéquia), Dinamarca e suecos. As motivações eram religiosas, políticas e disputas territoriais.

Antropocentrismo – É um conjunto de ações e ideias que colocam o homem no centro de tudo, podendo se chamar também de humanismo.

Para o movimento humanista, a ética e a moral dependem do homem. Assim, a criatura passou a ser a base de todos os valores, e não o Criador. No humanismo o homem é o seu próprio deus. Ele pode melhorar e evoluir, segundo seus preceitos, por meio da educação, redistribuição econômica e pelo saber humano.  

Segundo o Pr. Douglas Batista, os humanistas aprofundaram estudos na história antiga com o foco errado, visavam desconstruir os livros sagrados. De positivo, destaca-se a valorização dos direitos do indivíduo. Todavia, esta não é uma bandeira própria do humanismo.

A Bíblia, originariamente, contém um arcabouço acerca da liberdade e igualdade que antecedem a movimentos reivindicatórios de direitos humanos dos tempos modernos.

Do comentário Stamps – 1995, a Lei de Moisés do hebraico “Torah” que significa “ensino ou instrução” admite uma tríplice divisão: E atentar, Israel era um modelo divino, em formação,  em meio ao paganismo.

1. A lei moral, que trata das regras determinadas por Deus para um santo viver (Êx 20. 1-17).

2. A lei civil, que trata da vida jurídica e social de Israel como nação (Êx 21.1 - 23.33), bem como leis penais. Essas leis regiam o casamento, o divórcio, heranças, escravatura, multas, propriedade e outros temas relevantes para o Estado teocrático de Israel.

3. A lei cerimonial, que trata da forma e do ritual da adoração ao Senhor por Israel, inclusive o sistema sacrificial (Êx 24.12 - 31.18).

4.Havia preceitos de ordem alimentar e higiênicos aplicáveis à época.

5. Os Dez Mandamentos é a única Lei que reflete o caráter de Deus e é de natureza moral, espiritual, abrangente e contém princípios universais.

Destaca-se, ainda, que a Bíblia revela e ensina a igualdade entre raças, classe social e de gênero (Is 46.21-23; Gl 3.22,26,28).

O Cristianismo, sem ser revolucionário, tem se colocado contra o mal da escravidão, do racismo, das guerras (não matarás), da eugenia (só os saudáveis podem viver), das injustiças sociais de poderes corrompidos e pela valorização das mulheres e crianças.

A democracia, a educação moderna e os sistemas legais devem muito ao Cristianismo. Aliás, a maioria das grandes universidades, de origens, são frutos do trabalho e avanço do Protestantismo.

A Igreja ao longo dos séculos, mais notadamente após a Reforma Protestante, tem valorizado a vida, com ações sociais, dedicando-se aos enfermos, crianças de rua e marginalizados na sociedade. É o amor em ação pela justiça social.

Iluminismo - Surgiu na Europa, entre os séculos XVII e XVIII. Seus adeptos rejeitavam a tradição, buscavam respostas na razão, entendiam que o homem era o senhor do seu próprio destino e que a igreja, predominantemente romanismo, era instituição dispensável. O teocentrismo da igreja passou a ser questionado.  

Pós-modernismoModernidade Líquida - Estamos vivenciando a partir da metade do século XX. Sociólogos observam que a sociedade passou a ver valores e princípios sedimentados, que antes eram de caráter absolutos e estão sendo relativizados. Uma das principais características da sociedade pós-moderna é a superficialidade. A coletividade foi substituída pelo egocentrismo, alimentando-se do narcisismo, hedonismo, na busca da satisfação do ego humano.  

Ver postagem: http://samuca-borges.blogspot.com/2022/08/pos-modernidade-modernidade-liquida.html.

Narcisismo: Amor e culto à própria imagem.

Hedonismo: Dedicação ao prazer dos sentidos, o prazer como estilo de vida.

Porque as religiões, movimentos sociais e políticos terminam com o sufixo ismo?

O sufixo “ismo” vem do grego e indica uma ideologia, um sistema a ser seguido, algo consolidado como regra ou, que se acredita ser uma regra.

Ideologia: Conjunto de convicções filosóficas, sociais, políticas etc. de um indivíduo ou grupo de indivíduos.

“Ismo” então, no aspecto prático, indica um sistema de ideias, pensamentos, regras consolidadas de uma causa, um movimento, ou de uma instituição social.

A fé bíblica é racional. Dizia John Stott: “Crer é também pensar”. Já o racionalismo como sistema filosófico é nocivo a fé e levou muitos a caírem no ceticismo. A fé é auxiliada pela razão, porém é a fé que vê o sobrenatural (Hb 11.3).

Ceticismo – É um estado de quem duvida de tudo, de quem é descrente. Um indivíduo cético caracteriza-se por ter predisposição constante para a dúvida, para a incredulidade.

III – Tipos de Autoidolatria

Idolatria – Tudo o que toma o primeiro lugar de Deus na vida do homem. Deus não é prioridade em nossas vidas, em verdade, é o número um. Pessoas e demais interesses vem após o número um. Deus deve ser é a primazia sobre tudo e sobre todos.

A máxima de Jesus a esse respeito está em Mt 22.34-40, quando sintetiza a Lei em dois grandes mandamentos, quando responde a um fariseu e doutor da lei: Amar a Deus, o Senhor, de toda alma e entendimento e ao próximo como a si mesmo.

E na mesma linha da primazia a Deus, Jesus ensinou que quem não aborrecer (amar menos) pai, mãe, mulher, filhos, irmãos, e a própria vida, não pode ser o seu discípulo (Lc 14.26).  

O homem caído descrito por Paulo em II Tm 3.2-4 – É um indivíduo egoísta: amante de si mesmo; avarento: amante do dinheiro; odioso: sem amor para com o próximo; rebelde: sem submissão a Deus; e hedonista: amante dos deleites. Desse modo, o homem não regenerada tem a necessidade de autopromover-se, desenvolvendo uma opinião elevada de si mesmo (Lc 18.11), ao invés de negar a si mesmo e seguir a Cristo (Lc 9.23-24).

A autoidolatria na alma (vontade, emoções e intelecto) – do homem não regenerado, o seu interior é descrito como enganoso e perverso (Jr 17.9). E traz a idolatria no seu íntimo quando prioriza a reputação pessoal, busca o prazer como bem maior, nutre tendências supersticiosas e possui excessivo apego aos bens materiais. Ao contrário dessa postura, o homem temente guarda a Palavra de Deus no coração para não pecador contra o Senhor (Sl 119.11).

O culto à criatura se identifica também no cuidado com o corpo, pois vai além de prezar pela saúde, tem sido um narcisismo descarado.

A compulsão e impulsividade sexual humana – Os homens entregues à lascívia (sensualidade desregrada). A ausência de uma moralidade sadia e o controle dos impulsos sexuais, resulta em: imoralidade (Rm 13.13 — NVI) e libertinagem (2Co 12.21 — NVI). A concupiscência da carne caracteriza quem é dominado pelo pecado sexual (Gl 5.19). Não se trata apenas da prática do ato imoral, mas da busca intencional e compulsiva pelo prazer sexual ilícito (Rm 1.26,27; 1Co 6.15).  

A regra de ouro para fugir desse mal pecaminoso e vicioso é: “Vivam no Espírito e vocês jamais satisfarão os desejos da carne” (Gl 5.16 – NAA).

Conclusão:

1. A corrupção do gênero humano é consequência de sua rebeldia contra o Criador.

2. O problema da humanidade persiste em ser: Adão caído e não macaco evoluído.

3. A relativização do primeiro e grande mandamento amar a Deus sobre tudo e sobre todos, com toda alma e entendimento, tem desnorteado, desvirtuado a relação do homem com Deus.

4. Enfim, quem realmente quiser conhecer a natureza humana, leia, examine o manual do fabricante do seu Criador: A Bíblia.

 

Fontes da Pesquisa:

Lição EBD/CPAD – 3º Trimestre de 2023.

Bíblia Sagrada.

Internet.

Significados.com.br.

Anotações Pessoais.

Lição EBD/ADPE.

Condensado por Samuel P M Borges.

segunda-feira, 10 de julho de 2023

Cronologia - Abertamente gays e deficitariamente cristãos.

 Com amor, respeito e compaixão!



Cinquenta anos de história: Do relatório Kinsey (1948) à ordenação dos primeiros homossexuais brasileiros (1998)


A História caminha ora a passos pequenos ora a passos largos. No desenvolvimento da causa gay parece que ela andou muito depressa. Joe Dallas, um estudioso do chamado Movimento Gay Cristão, acredita que foi tudo muito rápido: nas décadas de 50 e de 60 os homossexuais diziam que eram seres humanos; na década de 70 eles se declararam normais; e nas duas décadas seguintes eles se levantaram o suficiente para afirmar: “Não toleramos nenhuma oposição pública ao nosso ponto de vista”. 

O mesmo Joe Dallas mostra a mesma evolução do movimento de outra maneira: de 1950 a 1976, os homossexuais diziam apenas isto: “Deus também nos ama”; de 1976 a 1979, eles deram um pulo muito alto: “Deus não só nos ama, mas também concorda que sejamos homossexuais”; e de 1980 até o presente, eles ameaçam: “Qualquer pessoa que diga que não podemos ser homossexuais e cristãos precisa ser silenciada”. 

A principal fonte da presente cronologia é o livro A operação do erro, de Joe Dallas, publicado em maio deste ano pela Editora Cultura Cristã: Caixa Postal 15136, Cambuci, 01599-970 São Paulo, SP. Telefone (011) 270-7099 e fax (011) 270-1255. 

1948 

Alfred Charles Kinsey, biólogo e estatístico norte-americano, publica Sexual behavior in human male (Comportamento sexual do macho humano). Kinsey é responsável pelo chamado “mito dos 10%”. Ele surpreendeu o mundo inteiro ao concluir que um em cada dez homens é homossexual, propagando a ideia de que o homossexualismo é muito mais comum do que se pensava. 

1950 

A Sociedade Mattachine (para homossexuais de ambos os sexos) e as Filhas de Bilitis (para lésbicas) começam a batalhar pelos direitos dos homossexuais. Os dois grupos têm uma estratégia conservadora: “Evolução, não revolução”. Os alvos são melhorar a imagem pública dos homossexuais (de “pervertidos” para cidadãos respeitáveis), descriminalizar as relações homossexuais e conseguir participação plena na vida americana para os homossexuais. Com o possível apoio de psiquiatras, cientistas e religiosos. 

1955 

O teólogo anglicano Derrick S. Bailey publica o primeiro desafio sério contra a condenação bíblica do homossexualismo, intitulado Homossexuality and western Christian tradition (Homossexualismo e tradição cristã ocidental). É nesse livro que aparece a tese de que Sodoma e Gomorra foram destruídas não por causa das práticas homossexuais, mas por falta de hospitalidade. Tal explicação produziu um grande alívio entre os homossexuais. 

1963 

A Comissão Literária do Serviço do Lar da Sociedade dos Amigos, mais conhecidos como os Quacres (a denominação protestante fundada por Jorge Fox na Inglaterra, no século XVII), publica um panfleto sobre a sexualidade humana, no qual permite relações sexuais antes do casamento, concorda com o adultério em alguns casos e considera aceitável o homossexualismo. Embora não reflita a posição Quacre oficial, o folheto vem a ser um dos primeiros marcos do Movimento Gay Cristão. 

1968 

Ativistas homossexuais fazem demonstrações públicas, uma na convenção da Associação Médica Americana, em São Francisco, e outra na Escola de Médicos e Cirurgiões da Universidade de Colúmbia, onde se realizava um congresso sobre homossexualismo. Usam panfletos, fazem protestos e apelos ao senso público de justiça para colocar suas posições. 

1968 (6 de outubro) 

Troy Perry, ex-pastor pentecostal, funda a primeira denominação evangélica gay, com o pomposo nome de Universal Fellowship of Metropolitan Community Churches (UFMMC). A essa altura, Perry, de 28 anos, divorciado da esposa, já havia sido excluído da Igreja de Deus carismática, por sua conduta homossexual. A Universal Fellowship é tida como a maior organização que congrega homens e mulheres homossexuais, com cerca de 300 igrejas em pelo menos dez países, inclusive, por último, no Brasil. 

1969 (28 de junho) 

Nove detetives à paisana entram no bar Stonewall, no bairro Greenwich Village, em Nova York, expulsam cerca de 200 fregueses que lá estavam e prendem o gerente, um porteiro e três travestis. Ao se retirarem do bar com os detentos, encontram uma multidão irritada, que começa a lhes atirar pedras e garrafas. Os policiais se entrincheiram dentro do bar até a chegada de reforços. O tumulto envolve a polícia e cerca de 400 manifestantes, e só acaba 45 minutos depois. Os distúrbios de Stonewall dão origem ao Gay Power (poder gay) e marcam o início do protesto público contra a discriminação de homossexuais. A data 28 de junho passa a ser “o dia do orgulho gay”. (Veja Gay power & gospel power

1969 (16 de julho) 

Três semanas depois dos distúrbios de Stonewall, uma igreja episcopal de Nova York abre suas portas para o segundo encontro de planejamento do Gay Power. A essa altura o homossexual Robert Williams já foi ordenado pastor episcopal. 

1971 

A Igreja de Cristo Unida ordena o primeiro pastor abertamente homossexual em uma denominação reconhecida. 

1972 

Quatro anos depois de organizada a Universal Fellowship, Troy Perry publica sua autobiografia The Lord is my shepherd and he knows I’m gay (O Senhor é meu Pastor e sabe que sou gay). Relata suas experiências religiosas e sexuais. Diz que era idolatrado pela mãe e que, depois da morte do pai em acidente de carro, cai nas mãos de um padrasto violento, a mando de quem é estuprado aos 13 anos, como castigo por querer proteger a mãe da pancadaria de seu segundo esposo. Cônscio de suas tendências homossexuais, envolve-se com homens antes e depois de seu casamento. Torna-se pregador batista aos 15 anos e evangelista da Igreja de Deus, aos 20. 

1973 (15 de dezembro) 

A diretoria da Associação Americana de Psiquiatria retira o homossexualismo da sua lista de disfunções, que até então era um desvio sexual. Bem antes era considerado um distúrbio sociopático de personalidade (até 1968). A decisão é tomada sob pressão muito forte da parte dos líderes dos movimentos favoráveis ao homossexualismo e em ambiente de intimidação. 

1974 (abril) 

Reúne-se a assembleia da Associação Americana de Psiquiatria para referendar a decisão da diretoria tomada 4 meses antes. Dos cerca de 10 mil votantes, 40% se opõem à decisão da diretoria de normalizar o homossexualismo. Os 60% restantes votam a favor. O resultado, afirma o psiquiatra Ronald Bayer, “não foi uma conclusão baseada na aproximação da verdade científica ditada pela razão, mas, antes, foi uma ação exigida pela emoção ideológica da época”. Esse comentário tem muito valor especialmente porque Bayer era simpático à causa homossexual. 

1976 

Dois anos depois de os luteranos terem organizado os Luteranos Interessados, outras redes de homossexuais foram formadas em várias confissões cristãs: a Afirmação, entre os metodistas unidos; o Integridade, entre os episcopais; o Dignidade, entre os católicos; o Afinidade, entre os adventistas do sétimo dia; a Convenção de Lésbicas Católicas; os Amigos dos Assuntos que Interessam a Lésbicas e Gays, entre os Quacres; e a Associação para Assuntos de Lésbicas e Gays, na Igreja de Cristo Unida. 

1976 

Forma-se nos Estados Unidos uma associação nacional de ministérios conservadores para ajudar aqueles que desejam vencer seu homossexualismo. Recebe o nome de Exodus, para lembrar a saída do povo de Israel do Egito. 

1976 

O pastor episcopal de renome e escritor de sucesso Malcoln Boyd revela sua condição de homossexual por meio do documento Off the mask! (Tire essa máscara!). 

1977 (janeiro) 

A Igreja Episcopal de Nova York ordena a primeira pastora abertamente lésbica. 

1978 

Letha Scanzoni e Virginia Ramey Mollenkott publicam Is the homossexual my neighbor? (Meu próximo é homossexual?), um livro discretamente em favor dos homossexuais cristãos, que conseguiu obter lugar nas prateleiras de livrarias cristãs e elogios da parte de críticos seculares e cristãos em revistas sérias, como Christianity Today, The Christian Century, The Journal of the Evangelical Theological Society e The Christian Ministry. 

1978 (outubro) 

Ex-pastor auxiliar de uma Igreja do Evangelho Quadrangular, já exonerado por má conduta (homossexualismo, prostituição, adultério e bebedeira), Joe Dallas visita a Metropolitan Community Church, a igreja protestante gay fundada dez anos antes por Troy Perry em Nova York. Embora certo de que os textos tanto do Velho como do Novo Testamento são claros e decisivos na condenação ao homossexualismo, Dallas tenta conciliar sua formação cristã com o comportamento homossexual. Ele mesmo confessa uma disposição mental escurecida, preparada para crer naquilo que lhe convém crer e não naquilo em que deve crer. Inicialmente indeciso e confuso com a aparente harmonia entre a conduta homossexual e os louvores entoados a Deus naquele ambiente, Dallas não demorou muito a renunciar suas convicções religiosas conservadoras em benefício de um espaço maior para viver sua homossexualidade. Daqui para frente ele será um homossexual cristão, naturalmente não promíscuo, mais temente a Deus e assíduo aos cultos. 

1979

Uma pesquisa realizada pelo periódico Medical Aspects on Homosexuality entre 10 mil psiquiatras revela uma preocupante discrepância entre a posição oficial da Associação Americana de Psiquiatria e a opinião de muitos de seus membros. Dos entrevistados, 60% disseram que os homens homossexuais eram menos capazes de “relacionamentos maduros e amorosos” do que os homens heterossexuais. E 69% disseram “sim” à pergunta: “O homossexualismo geralmente representa uma adaptação patológica?” 

1980 

Pelo menos oito livros em favor da posição homossexual já estão no mercado: Homosexuality and the western Christian tradition (Homos-sexualismo e tradição cristã ocidental), Homosexual behavior among males (Comportamento homossexual entre homens), Jonathan loved David (Jônatas amou a Davi),Homosexuality and counseling (Homossexualismo e aconselhamento), The Church and the homosexuality (A Igreja e o homos-sexualismo), The Lord is my shepherd and he knows I’m gay (O Senhor é meu Pastor e sabe que sou gay), Time for consent (Tempo para consentir) e Another kind of love (Outro modo de amar). A maioria deles foi publicada por editoras importantes (Westminster Press, SCM Press e Thomas Moore Press). 

1981 (setembro) 

John Boswell, por muitos anos professor de História na Universidade de Yale, publica Christianity, social tolerance and homosexuality (Cristianismo, tolerância social e homossexualismo). O livro de Boswell é tão importante para a causa gay quanto A cabana do Pai Tomás foi para a causa abolicionista. O professor apresenta dois argumentos básicos: 1) a Igreja nem sempre desaprovou o homossexualismo; 2) os textos bíblicos que parecem condenar o homossexualismo na verdade não se referem ao homossexualismo, mas a várias outras formas de imoralidade. Boswell, porém, além de homossexual, não é “nem um lingüista, nem um especialista em literatura, mas um historiador”, como observa Elodie Ballantine Emig, sua contestadora. 

1981 (9 de setembro) 

A Universal Fellowship of Metropolitan Community Churches, denominação que abriga gays em seu seio, fundada 13 anos antes por Troy Perry, solicita sua filiação no Conselho Nacional de Igrejas. Embora ecumênico e liberal, o Conselho nega o pedido e explica que qualquer tentativa de filiação seria uma “burrice impertinente”. 

1983 (primeiro semestre) 

O Conselho Nacional de Igrejas e a Metropolitan Community Church realizam um culto ecumênico, depois de dois anos de longas discussões sobre homossexualismo. 

1983 (segundo semestre) 

O Conselho Nacional de Igrejas adia por tempo indeterminado quaisquer planos de aceitar a Metropolitan Community Church como membro. 

1984 

Joe Dallas abandona definitivamente a Metropolitan Community Church (Igreja da Comunidade Metropolitana) e o estilo de vida homossexual. Ele desiste de ser as duas coisas ao mesmo tempo, gay e cristão. Em vez de romper com o cristianismo, rompe com a vida e o movimento gay. Ele havia se filiado a essa igreja gay seis anos antes (1978). 

1989 

A pastora Sylvia Pennington publica uma crítica mordaz ao movimento de ex-homossexuais com o título: Ex-gays? There are none! (Ex-gays? Não há nenhum!) O livro contém histórias de homens e mulheres que tentaram inutilmente mudar da homossexualidade para a heterossexualidade. Esse é o primeiro ataque pesado a qualquer movimento cristão de auxílio aos homossexuais. A partir daí o debate entre os “homossexuais cristãos” e os “ex-homossexuais” torna-se comum em programas de televisão e na imprensa. (Veja Ex-gays? Há muitos!)

1990 

A médica norte-americana Judith Reisman põe por terra todas as conclusões e os métodos do biólogo Alfred Kinsey, com a publicação do livro Kinsey, sex and fraud: the indoctrination of a people (Kinsey, sexo e fraude: a doutrinação de um povo). Uma das descobertas de Reisman é que 25% dos homens que Kinsey pesquisou eram prisioneiros, em especial criminosos sexuais. Isso quer dizer que os dados do livro Comportamento sexual do macho humano, publicado 42 anos antes, não foram tomados de uma população que representava com exatidão os homens americanos. O livro de Reisman e estudos subseqüentes desautorizaram, ainda que tardiamente, o mito de que 10% da população masculina dos EUA seriam homossexuais. 

1990 

Troy Perry, fundador da primeira denominação cristã homossexual (outubro de 1968) publica seu segundo livro: Don’t be afraid anymore (Nunca mais tenha medo). O primeiro (The Lord is my shepherd and he knows I’m gay) saiu 18 anos antes. 

1993 

O pastor Mel White, escritor e produtor de filmes cristãos, revela no livro Stranger at the gate (Estranho à porta) que é homossexual. A declaração choca tanto a comunidade cristã como a secular, por se tratar de um líder evangélico famoso, que até então cooperava com Billy Graham e Jerry Falwell. Mel White passa a ser o representante mais visível e influente do Movimento Gay Cristão. O autor confessa que não conseguiu vencer suas tendências homossexuais e acabou por se entregar a elas e encontrar um amante, a conselho de um psicólogo: “Aprendi a aceitar e até a celebrar minha orientação sexual como um dos dons de Deus”. 

1993 

Os produtores Teodoro Maniaci e Francine Rzenik filmam um documentário de 90 minutos sobre o Exodus International (entidade de apoio ao homossexual que deseja abandonar seu estilo de vida), sob o título One nation under God (Uma nação sob Deus). O filme reproduz entrevistas com homossexuais que tentaram inutilmente assumir o estilo heterossexual com o auxílio de ministérios como o do Exodus. O propósito do documentário é provar, só com o peso dos testemunhos e da emoção, que nenhum homossexual jamais poderá viver de outro modo.

1994 

John Boswell, autor do mais importante livro em defesa do homossexualismo, morre de Aids. 

1994 

O canal PBS projeta o documentário de Teodoro Maniaci e Francine Rzenik em sua série “Pontos de Vista”. Pela primeira vez, todos os Estados Unidos são expostos aos argumentos dos homossexuais cristãos que zombam da ideia de que alguém pode mudar sua orientação sexual, mesmo por Cristo. 

1995 

Com 14 anos de atraso, saem as duas primeiras refutações ao livro Christianity, social tolerance and homosexuality (Cristianismo, tolerância social e homossexualismo), do professor homossexual John Boswell. Thomas E. Schmidt publica Straight & narrow? Compassion and clarity in the homosexual debate (Compaixão e clareza no debate homossexual). E Marion Soards publica Scripture and homosexuality: Biblical authority and the Church today (Escritura e homossexualidade: Autoridade bíblica e igreja hoje). O primeiro foi publicado pela Intervarsity Press. Porque morreu no ano anterior, Boswell não teve oportunidade de ler esses dois livros. 

1996 

Doze anos depois de abandonar a Metropolitan Community Church e o estilo gay, Joe Dallas, aos 42 anos, publica A strong delusion (Um grande engano — mais tarde traduzido para o português com o título A operação do erro). Escrito por alguém que foi abertamente homossexual e que tentou harmonizar a fé cristã com o homossexualismo, o livro de Joe Dallas é de valor inestimável, sobretudo porque trata os homossexuais com respeito e as Escrituras Sagradas com mais respeito ainda. Dallas conhece e cita uma quantidade enorme de autores comprometidos com o movimento cristão gay. A strong delusion é dedicado à liderança de Exodus Internacional, com o seguinte recado: “Fiquem firmes”. 

1998 (31 de janeiro) 

Já instalada na América Latina e em várias partes do mundo, o ministério Exodus é organizado no Brasil. O presidente é o engenheiro agrônomo Affonso Henrique Lima Zuin, professor da Universidade Federal de Viçosa e presbítero da Igreja Presbiteriana da mesma cidade. 

1998 (11-14 de junho) 

Realiza-se em Viçosa, MG, o III Encontro Cristão sobre Homossexualismo, promovido por Exodus Brasil. A Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Travestis e Simpatizantes reage violentamente, denuncia na mídia o Encontro como fraudulento e pede à Organização de Direitos Humanos e à Ordem de Advogados do Brasil que impeçam a realização do Encontro. Solicita também ao Conselho Federal de Psicologia e Medicina que casse o registro de todos os psicólogos e psiquiatras que participaram do evento. 

1998 (23 de junho) 

Os homossexuais brasileiros Luiz Fernando, de 27 anos, e Victor, de 26, são ordenados pastores na Comunidade Cristã Gay, em São Paulo. A cerimônia é presidida por Neemias Marien, ex-pastor da Igreja Presbiteriana do Brasil. 

Judith A. Reisman: “A pesquisa de Kinsey é o mais flagrante exemplo de fraude científica do presente século”.

Fonte: Revista Ultimato setembro-outubro de 1998. Edição 254.

Nota do Blog: Esta postagem se restringe a cronologia do movimento, de 1948-1998. De lá para cá, a causa homossexual tomou outras proporções sob o guarda-chuva do respeito às diferenças e da diversidade cultural, o que não é objeto da presente postagem.

Samuel P M Borges

Natal/RN, 10/07/2023.

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